sábado, 23 de novembro de 2024

Como a União Soviética Ajudou a Criar Israel

 A criação do Estado de Israel em 1948 foi, sem dúvida alguma, um dos eventos mais marcantes do século XX, com raízes profundas em movimentos políticos globais e tensões geopolíticas, Entretanto um fato um tanto curioso e desconhecido para alguns é que. A União Soviética, surpreendentemente, desempenhou um papel importante nesse processo, especialmente nos primeiros anos da independência de Israel. Apesar de a URSS ter eventualmente se afastado de Israel e se alinhado com os países árabes durante a Guerra Fria, no período inicial, Moscou foi um dos principais apoiadores do novo estado judeu, tanto no campo diplomático quanto militar.

A URSS foi o primeiro país a reconhecer Israel oficialmente, em maio de 1948, e em seu discurso na ONU, em maio de 1947, o embaixador soviético, Andrei Gromyko, enfatizou a necessidade e responsabilidade com a partição da Palestina. 

Nas palavras do embaixador:

"O fato de que nenhum Estado europeu ocidental tenha sido capaz de garantir a defesa dos direitos básicos do povo judeu, e salvá-los contra a violência dos executores fascistas, explica a aspiração dos judeus de desejarem estabelecer o seu próprio Estado. Seria uma injustiça não considerarmos isso e negarmos o direito do povo judeu de concretizar essa aspiração. Seria injustificável negar esse direito ao povo judeu , particularmente considerando tudo o que ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial"

Mas o que mudou? Porque a URSS afastou-se de Israel? É sobre isso que falaremos nesse vídeo

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### A URSS e a Criação de Israel


O apoio soviético à criação do Estado de Israel está diretamente ligado ao contexto histórico do pós-Segunda Guerra Mundial. Durante a guerra, milhões de judeus (perderam a vida por meio dos crimes perpetrados pela Alemanha) foram mortos no Holocausto, o que gerou uma grande pressão internacional pela criação de um lar nacional para o povo judeu. A Palestina, então sob o controle britânico, era o local escolhido devido à conexão histórica e religiosa do judaísmo com a região.

A União Soviética, sob o governo de Josef Stalin, inicialmente viu a ideia de um Estado judeu como uma oportunidade estratégica. Em 1947, a ONU aprovou a Resolução 181, que recomendava a partição da Palestina em um estado judeu e um estado árabe. A URSS votou a favor da resolução, juntamente com os Estados Unidos, uma das raras situações em que as duas potências votariam a favor do mesmo projeto. Esse apoio foi crucial, pois garantiu a legitimidade internacional da proposta e pavimentou o caminho para a criação de Israel em 1948.

Stálin não autorizou que cidadãos judeus soviéticos imigrassem para Israel, mas não impediu que a Polônia socialista facilitasse a partida de judeus para a Palestina, especialmente judeus sobreviventes do Holocausto (da tragédia da Segunda Guerra) que viviam na Europa Oriental. Lembrando que a Polônia foi o único país da esfera de influência soviética no Leste Europeu que permitiu a imigração judaica sem impor grandes restrições.

A proibição da imigração judaica para Israel só foi oficialmente encerrada em 1971, levando primeira grande onda de imigração judaica dos anos 70. Estima-se que nessa época cerca de 200 mil judeus de origem soviética se estabeleceram em Israel. 

Com chegada de Mikhail Gorbachev ao poder, em meados da década de 1980 e suas políticas de glasnost e perestroika, diminuíram as restrições, permitindo a segunda e maior onda de imigração para Israel. Estima- se que, nos anos 90, 800 mil imigraram para Israel, entre eles judeus e não-judeus. Em 2000, esses imigrantes e a primeira geração que deles nasceu em Israel totalizavam cerca de 18% da população do país, cerca de 1,1 milhões de pessoas, em um país com 

Outro ponto de apoio central foi o auxílio militar, por meio da Tchecoslováquia, um estado satélite soviético, Moscou ajudou a armar as forças judaicas na Palestina. A Tchecoslováquia forneceu armas, munições e treinamento militar para as milícias judaicas, como a Haganá. Até mesmo os primeiros aviões da Força Aérea Israelense foram comprados da Tchecoslováquia. Esses recursos foram essenciais para que os israelenses defendessem o país recém independente durante a Guerra Árabe-Israelense de 1948-1949. Na época, os EUA, embora apoiassem formalmente a criação de Israel, proibiram oficialmente o fornecimento de armas para o Oriente Médio. 


### A Relação entre os Primeiros Líderes de Israel e Moscou


Os primeiros líderes de Israel mantinham uma relação complexa com a União Soviética. Muitos deles, incluindo David Ben-Gurion, o primeiro primeiro-ministro de Israel, foram influenciados pelo socialismo europeu, que moldou o movimento sionista trabalhista. O movimento kibutz, por exemplo, compartilhava semelhanças com os ideais comunistas de propriedade coletiva e igualdade.

Moscou viu inicialmente os sionistas socialistas como aliados naturais em um mundo bipolar, onde o comunismo e o capitalismo estavam em constante competição. A liderança israelense não era necessariamente pró soviética, mas havia áreas de convergência, especialmente no que diz respeito à construção de um estado com valores socialistas.

No entanto, ao mesmo tempo em que os primeiros líderes israelenses mantinham diálogos pragmáticos com Moscou, eles também eram realistas sobre a necessidade de equilibrar as relações entre as duas grandes potências, os Estados Unidos e a União Soviética, para garantir o apoio necessário à sobrevivência de Israel. Um minúsculo Estado, cercado de adversários


### As Motivações Soviéticas


As motivações soviéticas para apoiar a criação de Israel eram estratégicas. Stalin acreditava que um estado judeu na Palestina poderia ser uma vantagem contra os interesses britânicos no Oriente Médio, enfraquecendo a presença imperialista ocidental na região. Além disso, o apoio a Israel no início poderia atrair o novo estado para a órbita soviética, especialmente devido à influência socialista dentro de Israel.

Outra possível motivação era o desejo de Moscou de expandir sua influência entre as comunidades judaicas globais. Muitos judeus na União Soviética e na Europa Oriental viam a criação de Israel como um projeto progressista e estavam entusiasmados com a possibilidade de um estado judeu com valores socialistas. 


### O Gradual Afastamento


Apesar do apoio inicial, a relação entre a URSS e Israel começou a se deteriorar logo após a fundação do Estado. Uma das principais razões para isso foi a decisão de Israel de se alinhar progressivamente com os Estados Unidos e as democracias ocidentais. Durante a Guerra Fria, Israel buscava garantias de segurança e apoio econômico, algo que os Estados Unidos estavam dispostos a oferecer, especialmente devido à pressão da influente comunidade judaica americana. Temos um vídeo no canal explicando porque a comunidade judaica nos Estados Unidos é tão grande, link na descrição!

Outro motivo foi que, como explicado, governo soviético negava a imigração dos judeus soviéticos para Israel. A posição soviética era que todos os judeus soviéticos, como todos os soviéticos em geral, eram felizes e não precisavam mudar para uma "Terra Prometida" no Oriente Médio.

Na década de 1950, a União Soviética começou a apoiar abertamente os estados árabes no conflito com Israel. A partir da Crise de Suez em 1956, Moscou forneceu apoio militar e econômico a países como o Egito e a Síria, posicionando-se contra Israel em diversas guerras subsequentes.

Assim, a propaganda soviética mudou, e Moscou começou a ver oficialmente o sionismo como um movimento burguês e imperialista, em oposição aos valores comunistas. Além disso Stalin também temia que as lealdades dos judeus soviéticos se voltassem para Israel, o que levou a uma repressão contra comunidades judaicas na URSS.

A verdade é que a posição anti-israelense começou a conceder aos soviéticos uma posição favorável entre as nações árabes, em oposição ao apoio estadunidense a Israel. Algo bom para a geopolítica soviética no Oriente Médio, mas ruim para os EUA e Israel.  


### Importância Histórica e Desafios Futuros


Entretanto, não deixa de ser curioso pensar que o apoio inicial da URSS foi crucial para a fundação de Israel, especialmente no fornecimento de armas e na legitimação diplomática. No entanto, as divergências ideológicas e as alianças estratégicas acabaram empurrando os dois países para lados opostos durante a Guerra Fria. Hoje, a história desse apoio inicial é frequentemente obscurecida e esquecida pelas tensões posteriores a essa inusitada aliança. Mas a história é feita de momentos de aparentes contradições, e esse é um desses exemplos perfeitos. 

A verdade é que entre países o amigo ou aliado de hoje, pode se tornar o adversário de amanhã, ou vise e versa. Que o diga a relação entre EUA e Japão, mas isso é assunto para outro vídeo. 

Se você chegou até aqui, o meu muito obrigado e até a próxima. 

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